Entrezen, juntando as partes • bringing the parts together

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Trabalho de colagem que estou desenvolvendo. Cortando e colando, no papel e na vida, fazendo novas composições com pedaços do que se passou.

O Entrezen mudou, agora tem um pouco de tudo o que eu faço. Foi um longo processo que teve a ajuda de pessoas muito queridas. Mas eu não vou falar aqui da mudança que você já vê, mas da minha mudança interna para fazer essa mudança externa. 

A pandemia mexeu na vida de todos e para a minha vida e para os meus planos foi um grande chacoalhão. No ano passado, os meus planos também foram afetados, mas tinha essa idéia de que nesse ano seria diferente, eu iria voltar para os EUA. Mas a história não foi assim, e eu tive mais um desafio que foi perceber que ficar sozinha lá no Camburi não era uma coisa boa para mim. Era um sonho que eu cultivava de morar lá e fazer atividades zen lá na casa. Mas a realidade foi outra, fiquei muito sozinha, não encontrei a minha turma. Além disso o aumento da inflação e o custo de São Paulo me pegaram. No ano passado o dinheiro do meu aluguel cobria os meus gastos Pirenopolinos, mas aqui e agora a situação é mais complicada. 

Eu senti que o meu chão saiu de baixo dos meus pés e que eu estava me vendo como duas. A Carol que saiu do Brasil em 2013 e trabalhava com design e ilustração e a Engetsu que morou no Zen Center de São Francisco. As coisas que eu fiz lá são muito diferentes das que eu fazia aqui. Me senti uma pessoa partida, como juntar os pedaços? No nosso mundo você tem que se especializar, achar o seu nicho e seguir em frente. Não estava me sentindo inteira. E me vi cercada pelos meus medos. Será que eu vou dar conta? Enfim, não foi fácil e eu ainda estou atravessando, de pouco em pouco. A prática não é para não sentir mais, mas para aprender a ficar com o surge, o fácil e o difícil, doce e amargo. E eu sei que não sou só eu, que nós estamos atravessando um momento desafiador. Enfim, sigamos…

Obrigada Wans por me ajudar estruturar as idéias e Eva por me ajudar a fazer ele acontecer realmente!

Desenho zen • Zen Drawing

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Desenho feito durante sessão de modelo vivo do coletivo @Nua com a Marcela Müller

Quando fiz zazen pela primeira vez, me lembrei do desenho cego, quando você desenha sem olhar para o papel. E assim, a mente escapa dos julgamentos de “bom, ruim, feio, bonito, certo, errado”. Na hora em que você simplesmente olha, a realidade se mostra. É como é. E, nessa observação, nos mantemos no momento presente e, assim como no zazen, somos capazes de perceber a respiração e a maneira como ela vai se transformando. 

Mas a aproximação do zen com o desenho não para por aí. Quando se faz um desenho de observação, agora olhando para o papel, se percebe que as coisas não são o que se pensa delas. Por exemplo, para desenhar um nariz é preciso esquecer toda a ideia de nariz. E não é fácil. Tente fazer isso agora: dê uma olhada em um nariz. Como desenhar a transição entre o nariz e a bochecha? Não existem linhas marcantes, apenas sombras sutis. Dalton de Luca, com quem fiz aula de desenhos, sugeria que desenhássemos o “nariboca” (nariz + boca), “sobrancílios” (sobrancelha + cílios), os espaços entre as coisas. Uma arti-manha para desviar a nossa cabeça de conceitos e padrões, e simplesmente olhar o que existe. 

Nossa capacidade de percepção também está ligada ao ponto do caminho em que estamos. Por exemplo, num retiro que participei no Zendo, tive a função entregar os livros durante as cerimônias. E há um momento exato para se fazer isso, quando a prece está terminando e o sino toca. É nessa fração de segundo que se deveria começar a distribuir ou recolher os livros. Parece fácil, não? Foram quatro dias e meio e três vezes ao dia. E não foi fácil acertar o momento exato, às vezes foi rápido demais, ou muito lento; por vezes esquecia de fazer alguma saudação… Mas existe algo de belo nesses pequenos erros. A beleza de mostrar como sou e como estou no caminho. Com o desenho é a mesma coisa. Às vezes começo um desenho e, por algum motivo, as linhas vão crescendo e um pedaço fica bem maior do que o outro. Ou às vezes uma linha escapa, esqueço dela. Mas mesmo assim, o desenho já é. 

Existe também aquele momento do impasse, o desenho começado, com acertos e erros, todos ali. E dá aquela vontade de largar no meio, de simplesmente desistir. Sabe aquela vontade de mexer a perna quando ela formiga no meio do zazen? Aí então você faz a escolha: abandonar tudo naquele ponto ou seguir até o fim. Esse é o caminho. 

Desenho cego da Cibele Lucena de um encontro de zazenhos (assunto para um próximo post) E você pode ver os desenhos lindos da Cibele no instagram dela @cibele_desenha